quinta-feira, 14 de junho de 2007

Eu sei, mas não devia.

Eu sei que a gente se acostuma.
Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E porque à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã, sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado. A ler jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíches porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia. A gente se acostuma a abrir a janela e a ler sobre a guerra. E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E aceitando as negociações de paz, aceitar ler todo dia de guerra, dos números da longa duração. A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto. A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que paga. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagará mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com o que pagar nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes, a abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema, a engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às besteiras das músicas, às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À luta. À lenta morte dos rios. E se acostuma a não ouvir passarinhos, a não colher frutas do pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente só molha os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer, a gente vai dormir cedo e ainda satisfeito porque tem sono atrasado. A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se da faca e da baioneta, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida.
Que aos poucos se gasta, e que, de tanto acostumar, se perde de si mesma.

Yep! Nem preciso dizer que é um texto magnífico escrito por Marina Colasanti, e que são textos como esses que me fazem pensar e escrever sobre como estamos acomodados numa visão de mundo imposta a nós, sem direito a escolha. Pensem sobre isso...

7 comentários:

Unknown disse...

Bem,

Não há mt o que dizer depois de ler esse texto.

Eh para parar e pensar mesmo.

O silêncio diz tudo.

Unknown disse...

Então aí vai um pequeno Ctrl+C Ctrl+V da nossa conversa no msn.

(Eh pouco,
mas eh com carinho)

Karina diz:
no ínicio, lembrou o texto de filosofia, da caverna..
Karina diz:
depois, eu comecei a pensar oq todos dizem: avida eh assim, o mundo eh assim.
Mariana diz:
aí é o x da questão!
Mariiana diz:
todos pensam assim, a conformidade tomou conta do ser.
Mariiana diz:
essa é a fórmula do regresso do mundo !
Karina diz:
mas a maioria se acostuma mesmo, não é todo mundo que liga para mudanças, mesmo que para melhor. Isso exige das pessoas oq elas acham que não podem dar.
Mariiana diz:
sim, o que acontece é que as pessoas, na verdade, não acreditam que possa mudar pra melhor. eles conhecem a merda que tá, e tem medo de que possa piorar. se confortam, se acomodam, por medo.

Como Mariana disse,
pense um pouco nisso.

Anônimo disse...

O.O
nooooossa, q poetico XD, mas eh verdade isso, eu sou um exemplo vivo disso, me acostumo muito facil com as coisas q me acontecem ¬.¬
mas depois disso, realmente vou pensar na vida q eu levo ^^
vou ateh comprar um plantinha XD
e isso eh serio ¬.¬
eh muito bunito esse texto ^^
digno de uma mariana lol (apesar d nao ter sido vc leva o mesmo nome q o seu XDDD)
acho q non tenho mais o q falar.......ah eh!!! to com saudades de ti menina!!!^^.....ainda sou anjinho neh????

OBS: non disse q ia post nem q fosse daki a um ano ^^
depois eu posto nas outras, agora to meio sem tempo "o"

Unknown disse...

Oi, Linda!!!!
Saudade imensa de vc!!!

Como vc está???
Sumiu...
Nenhuma noticia sua...

Lov U so much!!!

Gabih Brandt disse...

Oiiiiiiii fofaa
seu flog tah super lindo!!
amei os textinhusss
Bjsss
e uma otima quarta pra ti ;)

Unknown disse...

t amuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu
d +
t
e
a
m
u

Karenina. :) disse...

amigaAaAa
terminei meu blog..
soh falta postar +..

rsrsrsrs...
=]


eh esse texto..
nem flo nd..
dps vc diz q eh totalmente futil, neh???

auhsuahush

bjoooo